quinta-feira, 28 de abril de 2011

O Significado da música "Gita" de Raul Seixas

Perguntando para algumas pessoas sobre o que achavam que Raul dizia com a música “Gita”, notei que cada um dá a sua versão e acredita que a música tenha mesmo só interpretações subjetivas e que não deveria haver uma interpretação mais correta que a outra. Mas, mesmo assim, essas interpretações formam um consenso; o ponto comum é que muitos disseram que a música tem a ver com deus.

A história que se conta sobre a letra da música “Gita” é que Raul lia um livro de Bhagavad Gita, um guru do hinduísmo, religião indiana. O próprio nome da música é uma alusão clara a esse fato. Raul então adormeceu com a idéia na cabeça e quando acordou começou a escrever a letra.
Prestando atenção na letra é fácil perceber do que ela fala.

A parte declamada no começo é o ponto chave para entender o que vem depois. Começa a música: “Eu que já andei pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho que ele me falou: ...”. Assim, o resto que é cantado, não seria o Raul dizendo algo a alguém, e sim, ouvindo algo que alguém falava, confirma a idéia de que foi depois de um sonho que a música foi escrita e que esse sonho foi motivado pela leitura de parte da doutrina de Bhagavad Gita. Sendo assim Raul, em vez de falar, ouve: “Às vezes você me pergunta, por que é que eu sou tão calado, não falo de amor quase nada, nem fico sorrindo ao teu lado...”

A doutrina da religião hinduísta é baseada no panteísmo. O panteísmo é a crença em que Deus está em todas coisas da natureza, não está em um só lugar e não é um determinado ser ou pessoa; deus para os hinduístas é a própria natureza. É isso o que diz a música toda: “Eu sou a luz das estrelas, Eu sou a cor do luar, Eu sou as coisas da vida, Eu sou o medo de amar”; “Por que você me pergunta, perguntas não vão lhe mostrar que Eu sou feito da terra, do fogo, da água e do ar...”.

Pensando por este ângulo dá pra compreender facilmente os versos: “você me tem todo dia, mas não sabe se é bom ou ruim, mas saiba que Eu estou em você, mas você não está em mim...”, isso porque deus, para os panteístas, está em tudo a que o homem tem acesso, inclusive dentro do próprio homem, pois o deus está no homem, porque o homem é parte de deus, mas o homem não está em deus, porque deus vai muito além do que o homem é.

Ao escrever isso, o significado de “Gita” me parecia cada vez mais óbvio, o que me levou a entrar um pouco em outro assunto e chegar a conclusão que muitas outras coisas devem ser tão simples de se entender, mas no Brasil, como em boa parte do mundo, a tradição judaico-cristã é imposta, embora haja liberdade de religião garantida pelo Art. 5° da Constituição, ainda há muito preconceito contra quem não seja católico ou protestante (evangélicos, espíritas, etc). Como se a crença de negros, índios e outros povos marginalizados fosse inferior. Aliás ateus, agnósticos, céticos e pagãos também tem a sua liberdade de crença protegida pela lei, pois se há liberdade de religião, para ser livre mesmo, tem que incluir a liberdade de não-religião.

Como poderia ser uma crença menor que a outra, se todos têm tantas provas de seus deuses quanto os cristãos? Ou seja: nenhuma! E todos, ainda assim, têm direito de ter fé, que consiste justamente em acreditar em algo sem precisar de comprovação, e se estiver precisando de comprovar, já está fraca a sua fé, pois já virou ciência.

Finalizando: mesmo que sua religião seja outra que ache o hinduísmo pareça uma sub-cultura religiosa, a música “Gita” de Raul Seixas fala de deus segundo o Panteísmo, e não o deus que está na doutrina que você conhece, mas tão real quanto todos são para e conforme as suas respectivas crenças. Discorde disso com uma condição: responder quem mais seria “o início, o fim e o meio” se não deus?

Nenhum comentário:

Postar um comentário